Tranquei a porta do quarto e separei os discos que iria
ouvir. Meus pais estavam velhos demais para checar o que eu fazia no andar de cima
e meu irmão havia viajado. Senti-me dono do espaço.
Peguei a garrafa que há meses se escondia no fundo falso de
uma gaveta da cômoda e enchi o copo. Tirei o tênis, liguei o som, aumentei-o o
máximo que pude e então dancei. Dancei pela tristeza. Por não estar em par – só ímpar.
Pisava em toda angústia acumulada ao longo dos anos, esquecia-me
da sua silhueta a cada giro solitário em torno do meu próprio corpo. Balancei
as ideias enquanto a cabeça se banhava de álcool e assim fui realizando minha
própria valsa. Meu batismo. Celebrei então a tristeza que, discretamente,
revelou-se uma ótima professora de bailado.
Dancei sem traçar sorriso nos lábios. De olhos abertos,
vidrados no nada que me pertencia desde o seu “adeus”. Dancei por mim, mas por
você também. Contorci os músculos da barriga, das costas, do tórax assim como
você havia feito com os do meu coração. E bati, bati forte os calcanhares em
perfeita sincronia com os bumbos de bateria e investidas de contrabaixo responsáveis
pelo peso da música – e o meu.
Cada gole, cada gota de suor, cada parede distorcida e
palavra intrusa que eu inseria nas letras das canções me libertavam do mundo e de
suas regras idiotas. Pouco a pouco, consegui apagar as lembranças e recordei-me
apenas de que ainda não tinha dado “play” na música.
Dancei porque estava triste. E a tristeza se basta.
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