sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Maduro mole

Calor, pouca roupa, uma regata, um shortinho, pés descalços. Tudo em tons amarelos, azuis e verdes. Aqui é assim, a vida no calor perfuma feito azeite na brasa, escorre lenta como gota de suor e se acaba num mar de lágrimas, de onde vem o sal da terra. 

Sobe a maré, desce o luar sob as ondas, quente, tudo, sola, areia, coqueiro queimado, cerveja  —sol líquido, um copo suado, um corpo ao lado, querendo-se, sentindo seu peso, pena ou pesado, vai bater asas de qualquer jeito quando sobrevoar as ideais do outro, os desejos dos outros, igual carcara faminto. 

Quem se quer no verão nunca mata a sede. Continua bebendo de todas as fontes, ri e dança, a música ganha outro tom, uma época diferente, mais livre, pelando à flor da pele e no cabelo fazendo arranjo.

É assim quando se olha pra ela, com os olhos de oliva, com os fios relampejando no mangue dos pelos cujo douro vem do fogo no topo do céu, a amolecer moleiras. Um cheiro de fruta no rosto, a boca ainda melada, os dedos brilhando e quando toca, gruda. Aí a gente não se larga mais. 

Precisa rodar, ficar tonto, amortecer os lábios e se sentir dono do mundo. Por alguns segundos, o delírio saboroso da caminhada pelo deserto sem oásis. A corrida pelo sertão seco, montado nas carcaças amanhecidas.

Café quente na mesa, língua mergulhada no amargor perfeito do bom dia sem resposta. Não existe previsão do tempo. É sempre hora. É sempre calor. É sempre muito. É todo muito, sempre hora. 

Se a pele está boa, o coração e tudo de dentro também está. Se o cheiro é de gente, sinal de saúde. Se arrepia, não é de frio, é de vontade daquelas que torra. Abana, sopra, só aumenta a brasa.

Não tem idade sob o sol. É todo mundo mole de tão maduro.