segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Sinta-se

Sinta-se
Prove-se
Redescubra as vias do seu corpo
Consulte aqueles velhos mapas com cada canto do seu físico
Redesenhe-se
Reencontre-se
Perca a vergonha que bocas amargas deixaram nos seus lábios
Aproveite para saborear o seu gosto a seu gosto
Conduza-se
Seduza-se
Alimente a chama que carboniza sua pele
Aperte com força suas próprias mãos
Pressione-se
Impressione-se
Pegue a faca e deslize sua lâmina sobre a veia saltada
Respire fundo, espere um pouco e então
Anule-se.

Minha escrita nunca fez sentido. Professores não compreendiam as redações. Diziam que eu me perdia dentro das orações que criava. Falavam de digressão em excesso e falta de linearidade. Era tudo o que precisava ouvir. Minha escrita era realmente só minha.

Ultimamente tenho conversado menos comigo mesmo. Conheço minhas queixas tanto quanto as vontades. Sei que no final das contas tentarei enganar a mim, no intuito de selar, por alguns instantes, a necessidade de criar mundos e mais mundos. Tudo isso para me desligar daqui.

Sinto como se a cabeça fosse um refúgio. Sempre que este lugar começa a me cobrar demais, arrumo minhas trouxas e parto. Parto para dento de mim mesmo. Fico inacessível por horas, envolto numa segurança sem nome. O frio não gela. O calor não faz suar. Viro uma rocha. Mas se você olhar bem no topo, verá aquela árvore solitária e frutífera, sempre fértil. Lá está minha essência. Quase inalcançável.

Acordei. Caíram as cortinas. O véu tornou-se transparente como água e então pude ver a cara da vida. Sem disfarces, sem máscaras. A vida que me foi oferecida como dote, dádiva e presente de um pai que nunca veio me visitar. Um pai que se esconde de mim. Que não me abraça. Um pai que está preso naquele velho livro de capa preta, tão obsoleto quanto o universo.

Acordei.

Joga fora a garrafa
esconde o cigarro
não esconde a fumaça
nem a risada
Ri de si
De mim, de nós
Perdeu o controle
E não sabe mais como abaixar o volume
Olham com pena
Com compaixão barata
E a inveja entra na sala
Sem pedir licença, senta no sofá
Pede só silêncio e finge que consegue ler os lábios
Mas seus olhos queimam

Joga fora o remédio
esconde o ácido
debaixo da língua
e as cinzas do cigarro
você pode deixar debaixo do tapete
E os cacos da garrafa
você pode manter debaixo da pele
Pra lembrar da dor
que cada gole lhe trouxe.
E o resto de si mesmo
você pode recolher e guardar de lembrança.

Sirva-se
Pois não há mais ninguém na mesa
Além da fome
E da solidão
Agora o coração não está mais sozinho
O estômago também está vazio.

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