terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Chega o fim da chuva

Já choveu demais. Já choveu por tempo demais. E não consigo mais abrir meus olhos pra enxergar o que de fato ainda boia dentro de mim. Todas as pequenas coisas que sobreviveram à enxurrada. Todas as coisas que guardei para você e só para você. Choveu tanto que só me restou transbordar.

Fluí como nunca antes. Busquei apoio, busquei chão para não afundar, mas nada. Nem nadar adiantou. Absolutamente nada conseguia me deixar fixado. Todos os dias eu escorria por algum canto, quebrava em algumas rochas pra só então deitar na cama e fazer uma poça do que havia sobrado do dia. E olhando para o teto via que as gotas não paravam de cair. Marcavam meu rosto e faziam escorrer lágrimas desconhecidas. Não eram minhas. Chovia pelos cantos dos olhos.

Comecei a sentir um peso no peito. Falta de ar e de espaço. Estava tudo alagado. Muita água, muita mágoa que, misturada com a casca de pedra que revestia meu coração, fez um lamaçal denso. Eu estava sendo tragado pelo meus próprios sentimentos. E nada da chuva parar.

Tudo acontecia enquanto eu te olhava à distância. Via e vivia na expectativa de um "sim". Acreditava que de tanta chuva o solo poderia ficar fértil o bastante para que brotasse dali uma nova vida. Uma nova chance de rescrever o que as marcas da erosão deixaram no chão. Mas não. Não foi isso que aconteceu. Só restou o pântano verde musgo tingido de esperança, onde encalhei meu dias sem pensar duas vezes, mas mil vezes.

Tanta chuva só causou a morte dos belos jardins que enfeitavam meu pensamento e a janela da nossa casa que nunca existiu nem nunca existirá. Cansei dessa chuva, cansei de seu gosto amargo. Era chegada a hora de secar.

Tentei abrir os olhos, mas a garoa acumulava água em minhas pálpebras e como calha eu precisava deixar escoar. Foi aí que percebi algo: sua imagem não era real. A imagem que eu tinha de você não passava de uma distorção causada pela água. Aquela aura, aquela beleza, aquela profundidade e sensibilidade não eram reais. Seu rosto trêmulo refletido na superfície do lago que se formou ao meu redor fez com que ficasse clara a falta de verdade nas suas expressões.

Enxuguei os olhos. Passei a ponta dos dedos enrugadas pelos cabelos e parei de chover. O oceano acumulado em meu peito começou a recuar e a maré revelou o que o mar não quis. Conchas sem pérolas, estrelas sem céu...

E tudo aquilo que te ofereci de coração.

Nenhum comentário: