quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Faísca



Não renego mais. Não sufoco o sentimento que aqui dentro gera calor e dor ao restante do corpo. Como faísca, como fagulha, ele busca a razão para então carbonizá-la sem piedade. Esse estalo de chama - que mal se sustenta na escuridão da minha caixa torácica - ilumina os pensamentos, ainda que timidamente. E lá na mente se faz quente. Revive-me essa tal combustão.

E eu sei que é amor porque - assim como uma vela - consegue resistir aos sopros do cotidiano. Alguns que saem de bocas amargas, outros que surgem dos lábios desejados. Sopros que tentam tirar de mim algo que só depende do meu querer, independente do ter. E dói, claro que dói. Qual é o fogo que não come? Qual é o amor que não consome algo para existir? O meu se alimenta de mim. Leva muito da minha paciência e paz, mas deixa no lugar uma falsa sensação de conforto, na qual se banham minhas frustrações - que quanto mais limpas, mais revelam suas cicatrizes. Não há vergonha em assumir que o passado virou receptáculo dos erros cometidos. Pago por eles até hoje. Neste exato momento, estou pagando antes que minha fagulha apague de vez.

No final das contas eu não queria ter a infelicidade de não sentir nada. Não queria ser uma cama vazia, feita pra se deitar com a ausência. Não, não queria e não quero. Mas um dia posso vir a querer. Só que esse "um dia" me custaria o dia de hoje e pensar no amanhã não me faz viver o agora. E eu preciso viver o agora.

Assim como a chama, necessito queimá-lo pra existir, de fato. Talvez eu seja privilegiado por não me render aos caprichos do coração. Sempre carente e insatisfeito, lido com ele como se fosse meu filho. Com cara emburrada, fica diante do bolo de aniversário que lhe comprei. Não demonstra alegria muito menos interesse no que vê diante de si. E é nesse instante que eu retiro meu isqueiro do bolso e acendo os "25". Aquela faísca, fragmento de estrela, faz amanhecer no rosto do garoto o sol dele de cada dia. Sem risada, mas com sorriso, sorriu-me. Enquanto na face do meu coração reluzia a tal chama, na minha escorria o rio formado pela velha chuva que me molhou por dentro.

E sei que com tudo isso o amor ainda vale muito. Ele não foi feito para ser tocado, assim como as labaredas também não. Ele foi feito para ser sentido, assim como calor que batiza o fogo. Assim como o ardor que sinto quando me aproximo demais de outras faíscas.

Não renego mais. Deixo escorrer, soprar, tremer e queimar tudo aquilo que dentro da minha essência se autoproclamou "sentimento".

Sinto muito. Muito mesmo. Chega até a arder. Se é que você me entende.

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