sexta-feira, 30 de julho de 2010

A casa das Marias

A casa das Marias
Paredes brancas, a escada é branca, os bancos na sacada são brancos. O portão, bem velho e enferrujado, ainda conserva um pouco da tinta branca que há anos cobria as tiras de metal. Era um dia de sol, céu azul e fadiga. Aquela casa me parecia tão misteriosa e quando olhei no relógio já eram 15h da tarde.

Sobe as escadas em passos lentos, mas ainda assim mantém o ar de animação em ver que alguém espera na frente de sua casa. Recebe-me com um forte abraço. Seu nome é Maria. Negra, corpulenta, de mãos firmes e braços aconchegantes, cheirando a maracujá e toda vestida de branco. As unhas estão impecáveis e percebi que ela tinha todo um trabalho especial de manicure. O terreno possuía uma espécie de jardim, com muitas árvores, todas frutíferas. Pés de laranja, limão, manga, maracujá (talvez daí venha o cheiro de Maria), melões pelo chão, mamão, carambola. Um jardim dourado, um mar de diferentes tons de amarelo. No caminho encontrei outra figura, alta, magra de olhar penetrante. Chamava-se Maria.

Olhou-me de cima a baixo, prendeu o cabelo com um grampo que segurava com os lábios e então abriu os braços. No primeiro momento achei que aquela era a "líder" da casa. Depois percebi que estava errado, como quase sempre. Maria perguntou se eu estava com fome. Não costumo aceitar comida quando me oferecem, sei lá, desde pequeno me sentia desconfortável. Mas não recusei desta vez. Maria me deu um doce de maçã, amarelo, delicioso. O relógio no meu pulso não funcionava, ainda estava parado nas 15h.

Ao sentar-me à mesa, duas mulheres pequenas chegaram e se apresentaram: Maria e Maria. Falavam bastante, perguntavam sobre o mundo lá fora como se nunca saíssem de casa. Suas roupas eram mais ousadas. "Shorts bem curtos", camiseta amarrada mostrando a barriga impecável, pernas que brilhavam ao sol como o mais puro petróleo. Lindas, cabelos com dreads e longas argolas como ornamento para suas orelhas pequenas. Riam, infestavam o lugar com uma alegria juvenil. As outras duas Marias riam sem parar. Me levaram para conhecer o dormitório.

No quarto gigante estava sentada uma senhora muito velha. Cabelos brancos como algodão e olhos negros. Não sei por que, mas quando me aproximei dela a primeira coisa que fiz foi beijar sua mão. Senti como se a conhecesse de muitas vidas e ela não disse uma palavra, ficou olhando para o meu rosto, acariciando-o, sorrindo de leve. As outras Marias mantinham um silêncio que refletia o respeito por aquela que, ao meu ver, era a matriarca. Fiquei preocupado com as horas, pois já fazia um tempo que estava entre as Marias e precisava voltar para casa. Meu relógio não funcionava, olhei para o relógio na parede do quarto de Maria e ele marcava 15h.

A primeira Maria que me recebeu queria mostrar o "cantinho" que fizeram no meio das árvores. Era um lugar mágico, onde a brisa tinha perfume de fruta e mesmo com o sol forte não se sentia calor nem frio, não se sentia nem alegria nem tristeza. Era um local onde as Marias se reuniam para ficar em silêncio. Olhei para o topo da mangueira e vi uma pessoa deitada sobre um galho. Ela me encarou e sua expressão mudou bruscamente. Gritou com as outras Marias querendo saber por qual motivo me levaram lá. As Marias explicaram à Maria que eu era apenas um visitante. Maria ainda assim ficou desconfiada de mim e seus olhos puxados como os de um lince me fitavam. Cruzou os braços, resistiu por alguns minutos e depois jogou na minha direção uma manga suculenta. Piscou o olho e saiu andando, descalça.

Tudo estava tão bom e melhorou ainda mais quando ouvi um som de fundo. Uma melodia que me hipnotizou, paralisou meus músculos. Procurei seguir as notas músicas até encontrar o responsável por tal melodia. Na última das árvores estava sentada uma mulher linda. Nem jovem demais, nem velha demais. Ela tinha uma flor amarela no cabelo negro e volumoso. Tocava uma flauta doce, mais doce do que o mel. E mel era justamente a cor de seus olhos. Nunca tinha visto uma pessoa tão linda, dentro de um vestido branco que confortava não só o seu corpo como também meus olhos. Sentei ao seu lado e ela segurou minha mão. Seu nome era Maria. A deusa da música, que tinha perfume de laranja. Fiquei escutando sua flauta até perceber que o sol não ia embora, mas eu precisava ir. Todas as Marias me abraçaram e disseram adeus. Ao sair pelo portão velho e enferrujado olhei no relógio, que agora marcava 15h01.

Sete Marias, negras, lindas, carinhosas, humildes, silenciosas, vivendo num jardim dourado com vários perfumes, com música com fé e com força. Sete formas de amar e de se expressar. Sete caminhos para o coração. Sete mães. Sete pedaços de Deus. Deus, em sete mulheres incríveis. A casa branca de móveis brancos era na verdade o abraço de mãe. O abraço vindo da casa das Marias.

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Smoking myself

Dentro do meu carro, com as janelas fechadas e com os pulmões ardendo. Trinta cigarros para 24 horas de esquizofrenia, no banco do motorista, no banco da praça sem ter o que comer, no banco que rouba meu dinheiro todos os meses, no banco que contrabandeia meu sangue. Estralei todos os dedos e mesmo assim continuo mordendo os lábios.

Tive um dia de merda, todos estavam contra mim. Isso não é novidade, nem mania de perseguição. Isso não está definido no seu manual. A rotina reúne em seu útero todas as coisas estúpidas que sou obrigado a fazer, para que estas, num instante mágico, criem algo que nascerá já como herói: O desgosto. Foda-se se você adora ir cumprir suas tarefas diárias. Foda-se mais ainda se você odeia meu olhar vazio ao entrar no matadouro. Não vou te dar o gosto de foder com meu humor, faço isso só de lembrar da sua cara.

Tudo te pressiona. Relógio, transito, filas, escadas, semáforos, faixas, sinalizações, alarmes, travas, senhas, metas, papeis, canetas assinaturas. Corre, pula, explode, esmurra alguém sem motivo, grita, berra, arranca um pedaço da mesa com uma mordida, tira os sapatos, quebra o vidro da janela do escritório, incendeio o refeitório, rasgue seus documentos ... Viva/Morra! Seja seu próprio juiz, se condene, considere-se inocente, mande cortar a própria cabeça. É tanta informação que você atinge a plenitude do Zero. Silêncio.

As cores estão extremamente saturadas, tudo é em exagero, uma porcaria total. Não se pode ficar triste em paz, nem engordar com felicidade, nem se manter magro comendo compulsivamente. Não pode falar palavrão, nem rezar na mesma noite, ninguém pode se sentir bem com finais trágicos ou criar uma bela família sozinho. Não se pode casar com quem sem ama, a menos que este/esta esteja na lista de pessoas respeitáveis. Não se pode deixar de viver, não é permitido conhecer o próprio corpo e os seus limites. Não se pode fazer porra nenhuma nessa desgraça. A unica coisa que é permitida, é a eterna condição de servo, de cordeiro, de massa guiada por alguém/algo/alguma coisa que se auto denominou Superior.

Se a vida é um presente que me foi dado, então que eu a use como bem entender. Se eu tenho livre arbítrio, então que este me liberte e permita que eu tenha a opção de não ser rei ou vencedor. Que eu possa ficar triste, chorar, sem ter que ouvir alguém me dizer "Melhore!". Eu não tenho fé no que o homem diz. Quero amar incondicionalmente quem escolhi, mesmo que não seja recíproco. Prefiro a solidão do que viver numa farsa. Prefiro não me relacionar com outras pessoas até que o amor que sinto torne-se combustível para o meu tipo de humor auto destrutivo. É neste momento que você atinge a plenitude do Zero.

Falto no casamento do melhor amigo, esqueço do aniversário da melhor amiga, deixo de ir visitar os familiares para beber no fundo de casa sozinho. Tiro o telefone da tomada para não receber uma ligação de "Feliz Natal", guardo as cartas de amor que ganhei só para lembrar de como fui patético. Evito os melhores amigos durante horas, converso na Internet mais preocupado com o jogo em que me inseri. Aposto alto, sigo sozinho, tenho momentos de caos e nunca estou só. Isso irrita e conforta ao mesmo tempo. Ah, claro e principalmente, sou um ótimo filho, aparentemente.

Odeio que me toquem sem que eu permita. Que isso fique bem anotado. Ainda sonho com acidentes no Metrô e que esqueci de calçar os sapatos para ir à escola. Dependendo da pessoa e seus argumentos, sou positivo e até um pouco esperançoso. Mas quando converso comigo mesmo, vejo o quão niilista me tornei. Esta é a minha zona de conforto. O garoto que pintava fora das linhas que a professora definia e era humilhado por isso. Aquele pequeno pedaço de desordem que, aos olhos da Laura, deveria ter nascido sabendo. Desenhos em que as casas, pessoas, animais flutuavam e o chão era a coisa mais chata de se fazer. Os detalhes que faziam toda a diferença. Resistiu, engoliu a seco toda a cocaína que acelerava o ritmo daquelas crianças malditas. Foi esquecido no dia da festa pelo próprio par, dançou com um pedaço de madeira e não viu seu pai na platéia. Cresceu sozinho, dentro de uma casa com 3 pessoas. Foram nestes anos que atingi a plenitude do Zero.

O universo foi criados por nós, Deus foi criado por nós, o amor, o ódio. Nós somos tudo. E por este simples motivo, não suportamos nós dentro de nós mesmos. Criamos regras e censuras para que o espírito de fogo não consuma toda a droga de razão que achamos ter. Se nos demos o direito de viver, se criamos o nosso criador, nada mais justo do que preparamos também nossa própria morte. A única espécie suicida do mundo apenas cumpre aquilo que se propôs a fazer. E você não precisa entender um final que já foi escrito antes mesmo do início. Talvez, a chave seja se permitir mais.

Enfim, foda-se.

terça-feira, 27 de julho de 2010

Who's Veny?

Noite agradável, uma boa dose de vodka pura, apenas um cubo de gelo. Hoje vejo que a melhor coisa que fiz foi escolher uma janela bem grande para a sala. Vejo a Lua nua, completa, e as estrelas tentam driblar a fumaça cinza da cidade. é uma batalha justa. Depois de um dia cansativo tudo o que mais quero é poder saborear a noite.

Na cozinha, muita coisa para ser lavada. Resolvi que me daria um jantar de classe. Fiz as coisas que mais gosto e comprei outras que não sabia preparar. Um dos maiores prazeres da vida é comer. As pessoas evitam isso simplesmente porque não sabem aproveitar o momento, comem feito criaturas doentes. Trilha sonora: Jill Scott. Perfeita. Foi então que o destino me pegou assim que a música You Got Me começou a tocar. O tempo ficou lento, de repente o som foi diminuindo e eu não conseguia me mexer. Perdi a noção de espaço. Acho que neste momento ganhei uma percepção ampliada que me fez ter a noção do que não tem explicação.

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Corre, existe um exército atrás de você. Eu me vejo dividido, me alerto, me salvo, me resguardo e participo da corrida psicótica por um segundo de respiração profunda. As ruas se tornam verdes e as casas estão pegando fogo. Olho para as janelas e percebo que são todas pequenas, sufocantes. A voz está distante, mas ainda assim me guia. Perco meus sapatos e isso me desespera. Vejo vagões de trem despencando de pontes. Tudo completamente vazio de gente, só existem pessoas correndo atrás de mim, de você.

Quando as pernas já não respondem mais, eu paro com a corrida. Tapo os ouvidos e grito com toda a força. Todo o cenário começa a mudar e as pessoas tornam-se falcões. Sobem imediatamente para o céu roxo e lá ficam me observando, esperando que o sangue dos meus joelhos criasse um rio onde matariam a sede. Foi então que deixei a minha mente recriar o ambiente. Casas de madeira, flechas nas árvores, rios prateados, muitas árvores, uma estátua gigante, cega e sem um dos braços. Uma fúria crescia dentro do meu peito, e então o céu que era roxo transformou-se em uma massa densa e cinza. Os falcões morriam a cada raio lançado sobre suas asas. Todos no chão, se uniram e formaram Ícaro. Velho, acabado, com asas postiças, implorando pelo meu perdão. Queimei-o vivo.

Todos me temiam, eu criava e recriava. Ninguém mais me perseguia, ninguém mais olhava diretamente nos meus olhos. Acabava de ser nomeado Rei do Caos. Construí um castelo com os ossos de Ícaro. Sentei em meu trono e tirei das cinzas a matéria prima para criar meus filhos. Nasceram sem olhos, sem ouvidos, sem dentes, com os cotovelos invertidos. Eu odiava a beleza, ela me excluiu uma vez, hoje sou eu que a excluo.

No segundo dia, destruí todas as criaturas. As sementes que plantei não cresciam. Puxei para fora do meu braço uma de minhas veias, esperando coletar meu sangue e dali me duplicar. Mas só consegui areia. Eu estava cheio de areia e no lugar do coração crescia um cactos. Eu podia tudo, mover montanhas, secar rios, inverter céu e mar. E nada conseguia matar minha insatisfação. Cansado de tudo aquilo, eu criei a melhor das minhas invenções: A morte. E para arcar com a responsabilidade de me guiar pelo desconhecido criei Deus. Tirei o peso das minhas costas. Ele me pegou nos braços e me apagou, fez de mim sua consciência censurada e perigosa. Tornou-se perfeito no exato momento em que transferiu minha existência para o vácuo do universo, me condenando a permanecer em constante expansão. Jamais caberei dentro de mim mesmo.

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Passaram-se 5 horas. O relógio havia despertado e no momento em que cai ainda tocava You Got Me. Voltei para a janela e olhei para a Lua que já despedia. Pela primeira vez, prestei atenção no espaço e seu vazio infinito. Fui dormir.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Interesse desproposital

Simplesmente sonhei com os olhos verdes e assim as coisas ficaram. No fundo eu já nem busco mais explicação/solução para as vontades que me surgem subitamente. Faz um bom tempo desde a última vez que estive por aqui. Optei por refletir um pouco mais, tentar compreender coisas que já foram compreendidas. No fundo, era a tentativa de criar uma "releitura" do que me foi apresentado como "verdade".

Muitos filmes, muita música, bebida suficiente pra não me deixar impaciente. Inconstante durante as obrigações e rotina, permanente quanto ao que é invisível e incontrolável. Talvez esteja me referindo ao destino. Mesmo sem acreditar muito nele eu o respeito, não por medo de suas decisões, mas por admiração. Admiro a capacidade que ele tem de me contrariar, e dias depois mostrar que eu estava realmente me enganando, não sendo enganado. Complexo, tenso, irritante...

Cansei de ficar sozinho. Mas tenho preguiça de procurar. Bastava seus olhos verdes saírem do sonho e virem aqui me buscar. Simples, não?

( x ) Sim ( x ) Não ( x ) ...

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Parte de mim corre para qualquer direção.

Estava concentrado nos meus livros. O terceiro cigarro já é tão familiar que parece durar muito mais tempo que os anteriores. Depois de tanto tempo esperando você aparecer resolvi deixar as lembranças para trás, desviando o pensamento para outra direção que não aquela que me levava direto aos seus olhos.

Tinha começado a escrever um conto. Era uma das formas que encontrei para descarregar a angústia ou culpar alguém pela sua ausência. Na verdade, eu sabia que a culpa era minha também. Os últimos meses serviram para que eu ocupasse toda a minha agenda. Coisa que eu odiava fazer. Mas parece que esta era a única forma de levantar todos os dias mesmo que estes já não tivessem cor alguma. Era sobreviver a mais um dia comum, estúpido repleto de pessoas que me atormentavam justamente por tentar me ajudar. Ajuda essa que eu nunca pedi. O mundo custa a entender que nem todos querem ser salvos, nem todos querem superar. Existem histórias que acabam mal, e deixam uma tristeza crônica somente pelo fato de que o final é como é. Nem todos os contos acabam em felicidade. Talvez nem tenha percebido quantos olhares e sorrisos recebi. Estava vazio.

Confesso que o meu lado criativo se sentiu muito contente com tudo isso. Eu criava na compulsão, não via mais arte, não via mais estética ou aura. Criava apenas para evitar me destruir. A vodka já não era mais tão relaxante. Criar tinha se tornado a razão de viver. Imagine, você ser feliz por longos anos e um dia a felicidade desaparece. E você tem que acordar para trabalhar, você tem que fazer tudo o que fazia, mas agora sem sentir vontade alguma. Você olha para o lado e vê casais felizes brigando, traindo uns aos outros, enquanto tudo o que mais desejava era ter de volta a outra metade do seu coração. Imagina, que droga deveria ser viver assim. Pois é.

Um dia, quando fui até a cozinha pegar mais café o telefone tocou. A voz demorou a responder, mas quando o timbre meio rouco tocou meus tímpanos não tive dúvida. Era você. Por te conhecer bem sei que não ia dizer o que estava acontecendo logo de primeira. Então, resolvi jogar qualquer assunto idiota para dar espaço a sua pessoa. Pois bem, quando percebi já estávamos falando de suas angustias, de suas decepções com o mundo. Adorei ouvir você admitir que eu "tinha razão", mas nem por isso me senti vitorioso. Não, a minha vitória foi não ter tirado de você o direito de errar, se decepcionar e se levantar com as próprias pernas. Nunca estivesse ao seu lado para viver sua vida como vivi a minha. Estava do seu lado para garantir que você não ia correr e se esconder. Apenas isso, mais nada. Ah, também estava lá porque te amo, e acima de qualquer outra coisa, te admiro.

Tem coisas que são simples, outras que são complexas mas breves. Algumas vezes não queremos parecer sentimentais ou admitir que o calor da paixão nos pegou. Mas no fundo, nunca tivemos dúvida daquilo que buscávamos, mesmo que não houvesse nomes ou cartões de Dia dos Namorados.

Não larguei os livros nem os cigarros e muito menos os filmes por sua causa. Não parei a minha vida ou deixei de criar dentro do meu mundo que se auto consome. Apenas deixei que você sentasse ao meu lado novamente, me abraçasse e desse cor às pinturas que fiz desde então.

sexta-feira, 9 de julho de 2010




Passaram-se duas semanas. Os primeiros dias não foram tão fáceis. De início parecia que toda a minha energia havia se esgotado.Não tinha ânimo para levantar, não queria encarar o dia e suas exigências patéticas. Mesmo assim levantei e fui adiante. Gosto amargo na boca, estômago gelando, impaciência, vozes dizendo para colocar um ponto final naquela situação. Crises que surgiam do nada e muitas vezes me faziam descontar a raiva nas pessoas erradas. Na verdade, não havia uma pessoa certa e isso me irritava.

Nos dias seguintes o silêncio tomou o lugar da agitação/insatisfação. Não queria falar, não queria responder, não queria perguntar. Saía do trabalho e andava pelas ruas, observando as pessoas e o mundo que as rodeava. Me afoguei nos filmes, mas parecia que quanto mais eu acertava na escolha, mais distante ficava da esperança que deveria me servir de base. Ou talvez fosse me servir de muletas. Evitei encontrar os amigos e estava mais uma vez me colocando num canto escuro e ridículo, um lugar que eu nunca fiz questão de ficar, pois trocava a tristeza pela cólera. Mais alguns dias passaram e eu comecei a andar novamente.

Isso não significa que as coisas tinham melhorado. Não, elas simplesmente perderam o "ar" de novidade. Voltei às bases, recuperei uma certa segurança e frieza que me eram familiares, foi assim que me ergui mais uma vez, mesmo sentindo meu coração mais pesado do que um rochedo. Distrai a mente com atividades superficiais. Admito, funcionou. Precisava gastar energia de alguma forma. Caminhar me faz bem, parece que o tempo fica mais lento e eu posso pensar em todas as coisas que preciso resolver ou que já não fazem mais sentido para a minha vida. Estava limpo, recuperando uma firmeza que já não lembrava como era.

Foi então que fiquei diante do vício. Diante daquilo que estive lutando contra durante todos estes dias. Não foi fácil, nem bom nem ruim. Foi meu batismo de fogo. O que vai ser? Não sei, nem procuro saber.

Na faixa que envolve meu coração, todos esperavam ver um nome ou uma declaração. Decepção, vazia de letras a faixa só deixa claro algo que sempre fez todo o sentido para mim: Meu amor não precisa ser intitulado, o nome dele é invisível para a maioria.