terça-feira, 6 de março de 2012
A dança
Ficar em casa. Dentro do quarto. Dentro da zona de conforto. Não sair e nem atender ao telefone. Estes eram meus planos para o domingo. Mas como bem sei, planos só servem para serem destruídos. Quando percebi, já estava passando a chave na porta e ajeitando os óculos.
Caminhei pelas ruas do bairro. O frio tirava as pessoas do caminho e só assim eu conseguia enxergar as belas árvores nas alamedas. Passei diante de uma casa velha e na varanda um garoto me observava. Seus sapatos verdes com detalhes em marrom me lembraram das árvores que há pouco tinha visto. Com seu pequeno violão, tocou algumas notas e cantarolou qualquer coisa. Fingi não ter visto e segui mais adiante. Subi algumas ladeiras até chegar à praça. Tudo vazio, menos eu.
Senti os passos atrás de mim e quando me virei, o garoto estava lá. Sorriu e se convidou. Havia planejado caminhar sozinho, mas como disse os planos só... Ouvi suas notas por muitas horas. Quando voltei, os ouvidos já não eram mais os mesmos. Algo os tinha atingido.
Outro domingo, e desta vez fiz diferente. Havia uma festa para ir então fui. O plano era evitá-la, mas... Enfim. Ao chegar no local, todas as pessoas mais populares se arrastavam pelos cômodos, como se buscassem algo fundamental para as suas vidas. Anos mais tarde eu descobriria o que era tão importante.
Sentado e afogado na bebida, olhava o chão para conseguir manter o mínimo de foco. Foi quando avistei aqueles sapatos que me faziam lembrar de hortelã e dias chuvosos. Músicas irritantes, as vozes agudas, não. Eu queria o grave de um baixo, o clima tenso de um fundo de bar e a paz daquele sorriso. Os olhos eram sempre os mesmos, mas lá no fundo havia algo de diferente.
Saímos daquele inferno e fomos buscar nosso próprio purgatório. No telhado da casa, saquei do bolso um player de música e dividi o fone. Suavemente, meus braços foram encostando-se aos dele. Quase perdi o equilíbrio, mas sua tranquilidade me conduziu com segurança. Foi então que a melodia envolveu toda aquela atmosfera. E o céu sobre nós converteu-se em inveja. Fomos banhados pelo luar e os olhos estáticos cintilavam como nunca. “Quer dançar comigo?”. Sim.
Mirou os ouvidos, mas acertou meu coração. Era a última dança. A última música. A última chance. Foi tão simples. Dançamos sobre os corpos esquálidos dos que nunca entenderiam aquele momento. Dois para cá e sete bilhões para lá...
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