quinta-feira, 28 de outubro de 2010

O papel sujo

Eram textos mecanizados. Foram poucas as vezes em que vi o escritor por trás dos parágrafos ou pelo menos parte dele. São linhas e mais linhas de ausência e formalidades. Tão superficial.

O jornalismo e seus textos técnicos, seguindo padrões e mais padrões que resultam apenas no enrijecer da produção criativa. A bola de ferro no calcanhar de quem só queria caminhar por entrelinhas. Não basta informar. É preciso permitir que o leitor seja capaz de reconstituir o ambiente ou contexto ao redor de si próprio. Faz-se necessário chamá-lo para a responsabilidade diante dos fatos ocorridos, não como mero observador inválido e incapaz, mas como ser ativo e inquieto, inconformado e curioso.

As alternativas para o jornalismo são poucas. Quatro anos na faculdade e você é apresentado a um vasto horizonte, rico em conhecimento e possibilidades. A chance de poder refletir sobre a sociedade e seus fatos, suas crenças, sua cultura. A filosofia, a psicologia, a sociologia... Todas elas, abrindo não só nossas mentes, mas também o coração. Nos faz lembrar que somos humanos e que compartilhamos o espaço com outras e outros e mais outros. Aprendemos sobre alienação e ideologia. Sobre religião e submissão. Sobre arte e contestação. Pensamos na cultura brasileira e suas raízes. Falamos de identidade a partir da memória. Reconhecemos a verdadeira geografia: aquela que derruba muros e fronteiras, que compartilha informação e tradição sem apelar para a hegemonia ou globalização capitalista. Percebe? O contato direto com a chance de fazer tudo de uma forma melhor. Mas então, descobrimos que na prática, nada disso será relevante.

As empresas jornalísticas, seus manuais, suas regras e dependência, a diretoria, os grandes chefes e os partidos políticos fazem do comunicador apenas uma máquina de escrever. Na verdade, somos computadores, apenas. Formatamos textos, assinamos matérias para arcar com a responsabilidade de publicar os pensamentos daqueles que se importam apenas com a reprodução compulsiva de seu dinheiro. O que é o jornalista senão uma peça inanimada? E aqueles que conseguiram se livrar deste destino? Eles existem, eu sei.

Nunca esperei tanto pela revolução, em todas as áreas e em todo o universo. As páginas dos jornais nunca foram tão sujas como as de hoje.

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