Nós.
A viagem já estava marcada. A decisão de ir pra longe - e sozinho - veio junto com uma velha vontade: aquele de se perder sabendo pra onde vai. Algo como se lançar ao desconhecido, sabendo que, de fato, trata-se do desconhecido. Uma necessidade que é complicada porque nasce simples: sair. Partir. Um parto, natural, que faz brotar toda a complexidade do ser, resumida num pequeno humano. Partir era o plano. Agora, cabia apenas encaixar os dias nos pedaços de tempo e organizar tudo. Nascer em outro lugar era preciso. Já não havia tanto espaço assim aqui, onde mesmo com posição, jeito, manha era difícil achar alguma forma de encaixar. Inclusive, esta nem era mais uma preocupação a berrar no canto das ideias. Havia emudecido esta tal vontade de encaixar. Demorei pra entender.
Eu.
Hoje ouvi uma música. Apenas uma, e nela fiquei. Bastava. A sensação preencheu o fundo da gaveta e o criado mudo abriu a boca. Suspirou, não disse nada, mas eu entendi que era pra ficar e fiquei. Parado, ali, olhando pra ele, tentando encaixar aquela letra que passava de um ouvido ao outro, pelo fundo da cabeça, dizendo que "todo carinho do mundo para mim é pouco". Remexi algumas peças escondidas, olhei seus pedaços, cada um mostrava fragmentos da sua foto. Os olhos distantes do rosto, mas perto do coração, como janela; a boca partida em duas, metade sorria, metade morria; as mãos, sem a maciez do toque, formavam um pedaço inteiro da imagem por conta das palmas bem abertas, esperando as minhas preenchê-las. As minhas mãos, do outro lado da moldura, encolhidas e cheias de pedaços que começaram a se encaixar. Senti falta. o problema não era o que eu sentia. Não havia problema em sentir, mas eu demorei pra perceber que o problema "é que eu amo você... e eu nem sei por que". De novo.
Você.
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