segunda-feira, 18 de abril de 2016

Dois em um




Dor em um
Direita que chove
Esquerda que seca
Meio que sufoca
Apaga a vela
Pra noite acesa
Fingir que não provoca

E dói. Dói ser dois, ser rachado, não ser direita nem esquerda, ser caminho, ser o meio, ser nada, porque nem completo é. Não olha pros lados. Sempre em frente, olhando pro nada, afinal, nem direito é. Subindo pra cair da escada. Faz porque fazem. Tenta sê-los, só que volta só. E dói.

Parei aqui para pensar. Não consegui me mexer. Pesei. Fiquei. Pensei: eu sei sofrer, o que não sei é chorar. E dói. Parece que a angústia é a razão do meu suposto devir. Um destino traçado, comido, engolido, por traças. Casca de verme nem pra adubo serve. Eu sou inamável. E dói.

Perdi as contas de quantas noites perdi pedindo para ser perdido pelos olhos dos outros. Invisível.

Nunca te disse quantas vezes eu desisti de dizer e "di" ser eu mesmo com medo de ouvir que o que eu decidi ser era indizível.

Tentei explicar e fazer sentido mesmo sentido com tudo o que não aconteceu, tipo eu ser seu, tipo eu, Romeu, agora morto, tipo insensível.

Daí resgato umas memórias e penso no que poderia ter sido, quem eu poderia ter sem ter tido, mas eu fui quem tinha que não ter, quem devia ter sido, mesmo que em si,  insípido.

Ali, calado, ao lado direito esquerdo, doído e largado, no largo, deixei de ser, em alto e ruim som, e passei a ser passado. Para trás, superado como aquele eco inaudível.

Sumi da lembrança. Caí em desuso, como Deus mudo que a gente agradece em prece com pressa da resposta, aquela que nunca vem. Virei retrato na parede deles, um vulto, um rastro. Totalmente intocável.

E dói. Mesmo eu sendo invencível.

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