quarta-feira, 7 de dezembro de 2011
Não vejo cores, mas as ouço
O refúgio está no silêncio. Quando a casa vazia abriga apenas minha ausência, sinto que o tempo começa a correr ao contrário e as velhas fotos voltam para a parede do quarto. Os corredores revivem flores e velhos móveis. As escadas fazem menos barulho. Meu coração bate mais calmo.
Não consegui adormecer. O mar cantarolava qualquer música e meu corpo pedia por uma caminhada. As ondas, em sua dança particular, conduziram-me por quilômetros até que encontrei aquela grande pedra. Coração da terra. Mais solitária do que nunca. Enquanto observava a imensidão, lembrei das pessoas que deram cor ao meus dias.
As verdes me traziam uma paz sobrenatural. Sempre centradas e com o tom de voz bem suave, sabiam me decifrar apenas pela vibração das cordas vocais. Procuravam nos meus olhos o que havia sobrado do último sorriso. Na esperança de não deixar que minha alma se rendesse ao sono dos inconformados, eles diminuíram a velocidade da vida e me embalavam numa longa melodia capaz de misturar o sal das lágrimas com o doce dos lábios.
Os vermelhos queriam mais de mim do que eu mesmo poderia pedir. Consumiam-me diariamente e colocam à prova toda a criatividade que viesse a ter. A diversão se misturava com a forte insegurança refletida nas palavras repetidas e no vocabulário propositalmente vasto. Aceleravam o tempo para que os maus momentos fossem breves interlúdios na longa jornada de um único dia. Apostavam no erro e o transformava em acerto. Alquimistas do intangível, sabiam lidar com o fogo, com o metal e com o sangue. Com eles, lutei sempre que pude.
As amarelas guardavam no sorriso o conforto do abraço de mãe. Gigantes e imponentes, tinham uma aura tão acolhedora que perto delas me sentia como um pequeno planeta girando em torno do sol de ouro. Alimentavam minhas ideias com a luz de sua segurança. Aqueciam meus dias e respeitavam meu período nas sombras. Tiravam do sabor dos alimentos a mágica de tecer um nosso gosto que superasse o amargo na boca. Tais pessoas deixavam de lado a própria vida para que as outras cores pudessem se manter em eterna plenitude.
Os azuis sempre me encantaram. Em especial, por sua distância do mundo real e o respeito pelo silêncio. Detentores de um saber único, transitavam - sem dificuldade - pelas vias da tristeza e traduziam o amor em pequenas doses de carinho. Implosivos, mostraram-me o infinito de sua sabedoria. A felicidade dos azuis se fez no instante em que o céu adotou sua cor como pele. Nesse momento, eles sorriram através das estrelas.
Eu, o preto, consumo todas essas cores. Sou eu o debilitado, incapaz de criar tais sentimentos dentro de mim. Preciso de cada uma das cores para me manter vivo e elas me servem de motivo para continuar. Aqueles que têm como cor o preto surgem para eliminar os excessos. Céticos, buscam em cada detalhe a queda das verdades e explicações inflexívies. Lidam com a contradição como se está fosse tão necessária quanto a sabedoria. E de fato é. Ultrapassam as linhas entre real e fantasioso para que suas mentes possam morrer e reviver das próprias cinzas. Acreditam no equilíbrio, mas desdenham das doutrinas. Eu, o preto, sou um pedaço do universo que por rebeldia se desprendeu do vazio.
E você, o branco, ainda encanta meus olhos. Com um toque, reuniu todas as cores possíveis e impossíveis para desenhar, à mão livre, todos os cantos do infinito. Criador da temperança, ensinou às outras cores a arte de se misturar. Não separou os quentes dos frios. No seu coração, fez com que eles produzissem uma luz tão forte que após sua ascensão nada mais cegou minha mente. E meus pulmões negros se encheram de um silêncio bucólico.
Enquanto vivermos, as cores serão o que são. Parte de nós. Parte de tudo o que nós mais amamos e odiamos. Parte do silêncio. Parte do nosso refúgio.
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