Não havia mais nada a ser feito. Este era o último dia de vida na Terra e o céu estava em chamas. As pedras começaram a cair. Fazia sentido. Apedrejar os pecadores, coisa de gente que se considera perfeita. Coisa de Deus.
Não queria ficar perto da minha família. Vê-los morrer, não, melhor procurar outro local para o fim. No peito, aquela sensação ruim de que estava partindo cedo e que todas as maravilhas da vida estavam explodindo junto com as rochas gigantes que riscavam o céu. Uma mistura de medo e frustração, de total niilismo e indignação. Por que nós? Somos as criaturas mais incríveis, criamos muitas coisas, superamos muitas doenças. Mas, quando prestei atenção no horizonte e vi que o sol ainda continuava belo no final da tarde entendi o porquê de estar ali, parado, em pleno fim dos tempos.
(...)
O universo. Corpo infinito, repleto de partes, partículas, órgãos, vida e ausência. A constante expansão era como o som que se propaga no ar, mesmo que este não fizesse parte da sua composição. Silêncio e ruído. Cada pedaço daquele infinito parecia se conter dentro das linhas de poeira cósmica e energia sem origem definida.
Um grão de areia estava fora do lugar.
(...)
Eu vivia em um mundo onde a causa de todos os desastres era justamente a existência da minha espécie. Seja qual for a explicação que os religiosos têm sobre os motivos da destruição, uma coisa é fato: o ser humano sempre estará lá como protagonista. A raça incrível, que podia e fazia acontecer, vivia como parasita apenas consumindo e, por motivos óbvios, reconstruia para poder destruir. Comida só remete à fome. Água à sede. Os animais irracionais dão exemplo de vida em harmonia, seguindo apenas as regras da natureza e nós, os evoluídos, somos prisioneiros das dúvidas que criamos e que insistimos em sanar, mesmo depois de descobrir que muitas delas têm respostas irrelevantes.
Nós, os abençoados por diferentes entidades, conseguimos ouvir apenas a uma delas, a que diz: "mate". Não há nascimento que compense a morte dos sofridos, nem mesmo lei que consiga punir ao ponto de retirar do coração a superfície dura do rancor. Uma nação amamentada pelo medo e suas neuroses, escrava da razão que não busca sabedoria, apenas acumula e manipula o conhecimento. Das mãos negras que recolhem ossos e diamantes. Das mãos caucasianas que engatilham a arma. Das mãos negras e caucasianas que julgam mãos que são do mesmo sexo e estão dadas. Mãos que possuem o polegar opositor.
Nesse momento, não tive mais medo. Entendi a beleza e essência daquela cena e percebi que o fim não tem fim. É apenas o recomeço que se manifesta diante dos meus olhos.
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