O descalço da terra sob os pés amacia a passada. Gira, gira,
cai no calor do entardecer, suado rodopiante, sozinho. Escorrega bastante,
entregue ao tombo, ainda quente, como se tivesse acabado de nascer. Cai de
maduro com mel na casca escorrendo devagar, suando os olhos dos outros, colando
de leve na pele de quem por ele passar. O perfume de fruta, o olhar de fruta, o
peso de fruta, sabor de ninguém. Só dele, só ele se sabe.
Não é festa, é agonia. Queima por dentro e por fora num azeite-desejo sem fim
–cheirando a cara toda. O vizinho olha pela fresta da janela e se arrepia. Sua
boca abre até a goela fazer bico. Nada sai, nada entra, fica lá olhando o outro
semeando.
Queria um dia pegar um vagalume com as mãos e manter sua luz
acesa dentro da mais profunda penumbra. Desejo de criança e de adulto, de velho
também, esse de manter alguma luz. Nada do calor passar, nem a noite esfria. Pra
dormir é mais de um banho. Tem que toda hora se molhar. A pele tá boa, forte,
aprendeu a lidar com o olho do sol. Não descasa, só muda de pele quando precisa
sumir.
A casa é pequena, de longe não dá pra ver. Está rodeada de
bananeiras, uma cerca de madeira capengando no arame banguela, uma mexeriqueira
seca, o que mais couber na vista de desocupado. Ascende a luz alaranjada pra
não esbarrar nas coisas que nem tem. Toma cuidado porque não há mais do que
cuidar. O que cuidar. O dia passa junto da noite, começam e encerram juntos.
Ele fica ali, na sua vida medíocre, achando que o mundo já é grande demais para
ele alargar com suas ideias.
sexta-feira, 17 de março de 2023
Fruta
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