Antes de estilhaçar seu crânio, a explosão havia esfarelado outras montanhas. Corria lenta, de longe, enquanto nas beiras da completa destruição sequer deixava um segundo para se tentar fugir, esconder, viver. Como não dizer que estava viva a obliteração completa da vida? Chamá-la de morte, então? De fim? Como, se havia apenas começado a alguns instantes? Fotografava em sua última memória - ou talvez a primeira próxima - algo que, de fato, ninguém veria.
Não era apenas fogo alaranjado como o de forja. Misturava-se também com terra escura. Comparou com as vezes em que usou os próprios dedos para fazer caminhos no barro, intervindo na paisagem natural. Comparou com vulcões sangrando também. Enquanto se expandia a devora do tudo, percebia que a morte era menos assustadora do que a vida contou. O que mais se sobressaía à sua chegada era uma profunda curiosidade. Magnetizava-o. Puxava-o para o não saber, por querer saber. Morte que chama.
De repente, chuva quente. Um vento de despedida que rodava feito abraço da partida. Sopro no rosto acalma. Inevitavelmente, tudo remetia ao adeus. Talvez por conveniência, mas ele não se importava. Estático, apenas aguardava o momento em que seria engolido pelas fúrias da terra vivida. Nada poderia paralisá-lo mais do que o desprendimento absoluto de uma história a qual foi obrigado a escrever. Mesmo sem saber, preferia acreditar que depois de alguns minutos, passados, lembranças, nomes, antigas dores, os desejos não vividos, tudo isso nada seria além de um eterno presente engasgado na garganta do vácuo existencial. Não haveria mais ele para dar ao pó memórias. Seria apenas pó, sem ida nem volta. Sem móvel, estante ou cômoda.
O calor deitou sobre sua pele. Olhos viraram duas supernovas e o branco absoluto prevaleceu. Conseguiu seu objetivo. O branco foi o último a ser visto. Do outro lado, observou ele se render ao seu constante desejo de aniquilação. O branco absoluto conseguiu.
A pequena esfera, há alguns metros de distância, correu mais do que o tempo e foi crescendo conforme se achegava no alvo. Ele percebeu que a rigidez do ferro sumira e em líquida partícula transmutava-se a devastação. Ali, precedia o olho o olhar, parecia o de um bicho dos que era caçado, não dos que caçava. Olhar de presa, de abate, do tipo que é grande, negro, profundo, inocente e em constante pedido de misericórdia. Quem destruiria a quem, no final do estouro? Negro, profundo e destruído.
Explodiu seu rosto.