terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Toque de areia


Das mãos secas, o toque de areia corria pela pele feito rio de um passado esquecido, deixando nas dunas curvilíneas do corpo deitado um rastro de ontem interminável. Afundavam-se os dedos confortáveis naquele desejo  movediço e lento, morno e suave que me fazia erosão nos lábios. Deixava o sol queimar a cama amarelada, invejar nossos dias mais longos e ser rei somente quando, cansados, cochilávamos sob seus coléricos raios ultra violentos.

Quantas vezes você me deixou escorrer pela garganta da sua ampulheta? Quantas vezes eu fui muito no começo e quase nada no final? Quantas vezes repetimos o tempo em grãos, contanto cada primeiro dos nossos segundos beijos? Recontando as sensações numa tentativa humana - demasiada humana - de viver o que foi bom como se fosse, de fato, pra sempre? Sempre assim. Todas as vezes. Muitas, inclusive.

Esfarelados no sofá da sala alheia, correndo pra não pegar chuva demais ou se cobrindo de maré cheia, amávamos-nos assim, por todos os cantos onde poeira fosse aceita. Deixávamos para o mundo um (pó)uco de ambos. E quando os dias difíceis vinham fiscalizar nossa bonança, você me sacudia da sua pele, tentando se libertar daquele rastro gasto de vontade incessantemente latente. Mas numa próxima brisa, lá estava eu novamente, dissolvendo-me em você. Cobrindo meu homem de outro homem.

Toque-me, sinta minha tempestade de areia dançar com seu corpo, feche os olhos, evite-me aos poucos, mas envolva-se como nunca antes. (A)Funda-se a mim.

Pois da areia viemos, e na areia nos amaremos enquanto houver deserto à flor da pele.

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